Manchineri

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

ACREditar - Defender Nossa Fronteira, Nossa Floresta, Nossos Irmãos...


CURUBA NÃO SE TRATA COÇANDO

POR JOSÉ CARLOS DOS REIS MEIRELLES
Direto da Frente de Proteção Etnoambiental Xinane, na fronteira Brasil-Peru

Companheiros,

ontem eu estava meio "mordido de caititu" e espoletei. Com razão, creio.

Hoje, sendo mais frio e menos emotivo (se é que é possível pra mim não sê-lo em falar dos parentes brabos), a situação aqui ainda não está resolvida, existem muitas dúvidas a serem esclarecidas.

Afinal o que esse povo e o português preso faziam por aqui?

Creio que existem ainda pessoas desse grupo escondidos aqui por perto, esperando a poeira baixar.

Sendo otimista e achando que o Exército com seu Batalhão de Selva resolva sair do quartel e, em vez de passar o dia aparando a grama dos jardins do quartel, resolva repuxar cipó aqui nas matas pra ver se encontra, ou espanta de vez esses traficantes. Mas isso é como tratar curuba coçando-a, ou carregar água em paneiro.

O problema aqui é bem maior, extrapola os limites internacionais do Brasil e a própria competência da Funai. Não estou dizendo que isso é exclusivo do Peru. Temos, dentro de nosso território, todo tipo de agressão a índios isolados ou não. Mas nas faixas de fronteira (e este é um caso emblemático) as desgraças podem vir daqui ou de lá. Agora é do Peru.

Como proteger os isolados, que usam tanto o território brasileiro como o peruano, transitam em suas terras pra lá e pra cá desta linha imaginária que traçamos, para dividir os dois países - o paralelo 10º Sul? Ou os dois países tratam desse assunto conjuntamente, colocando nas agendas binacionais os índios, isolados ou não, protegendo suas vidas e territórios, ou teremos uma fronteira de brancos e índios, todos atolados até o pescoço na exploração ilegal de madeira, no tráfego de cocaína, ou sei lá mais em que atividade ilegal.

Estes vastos territórios, que à vista grossa parecem terra de ninguém têm dono: os índios.

Desde 2006 venho alertando para a movimentação de madeireiros nas cabeceiras do Rio Envira, no Peru, e o perigo para os isolados. E a exploração lá se dá em uma reserva para isolados, Murunahua.

Tive a oportunidade de, junto com o presidente da Funai, Márcio Meira, visitarmos a embaixada do Peru em Brasília, alertando o embaixador das consequências da exploração ilegal de madeira na reserva Murunaua.

Também estivemos juntos em Pucalpa, tratando do mesmo assunto com ONGs e representantes do governo peruano. Pregamos no deserto, tipo São João Batista. E pelo andar da carruagem,
começaremos e comer gafanhotos.

Não sou mais funcionário da Funai. Trabalho no governo do Acre, a convite do governador Tião Viana, que, diga-se de passagem, tem dado todo apoio possível para sairmos da crise em que nos encontramos. Estou aqui na Base do Xinane dando minha modesta colaboração a todos que aqui estão, pela longa vivência de 22 anos que residi aqui nas cabeceiras do Envira, nesta mesma base.

Quero deixar claro também que não fizemos as operações como o esperado, não por culpa das pessoas que aqui estiveram, da PF e do BOPE. Todos eles têm vontade de ganhar a mata com nossos mateiros e resolver a questão. Assim também o pessoal da Força Nacional que aqui se encontra.

O que precisam é de ordem expressa de seus comandos. Fica o registro para sanar os maus entendidos.

Finalizando faço um apelo às autoridades maiores de meu país: ganhem um pouco de tempo e pensem na responsabilidade que é ter em suas mãos o destino de povos que vivem autônomos nestas matas. Assustados, talvez assassinados (como se isso fosse novidade para eles) e sem o menor conhecimento que nem futuro poderão ter, se o Estado Brasileiro decidir que o que acontece aqui é uma crise momentânea.

Lembrem-se da sabedoria das matas: curuba não se trata coçando. Ela vai aumentar, piorar e apostemar.

Seres humanos não merecem esse tipo de tratamento.

Um grande abraço a todos.

José Carlos dos Reis Meirelles é sertanista

Fonte: Blog do Altino: http://altino.blogspot.com/2011/08/curuba-nao-se-trata-cocando.html

Sertanista e sua Luta pelos Isolados


"NÃO DÁ MAIS PRA ESPERAR CALADO"

Sertanista critica operações da PF e Força Nacional de Segurança na fronteira Brasil-Peru


POR JOSÉ CARLOS DOS REIS MEIRELLES
Direto da Frente de Proteção Etnoambiental Xinane, na fronteira Brasil-Peru

Senhores,

Em toda a minha vida profissional de 40 anos de trabalho com os índios, isolados ou não, sempre soube a hora de calar, de respeitar hierarquia.

Soube também protestar a meu modo, quando necessário, a meu modo, jeito e responsabilidade. Pois agora é a hora de gritar, e alto! Embora isso signifique, como já aconteceu quando fui demitido da Funai, na criação da SBI que protestava contra o regime militar da época, a favor dos índios.

Lá vou eu, depois de velho, de novo.

A Frente Etnoambiental do Rio Envira, no Acre, como todos sabem, foi tomada por uma força paramilitar estrangeira, composta de traficantes e provavelmente acompanhados de índios recém contatados do Peru.

A Polícia Federal veio à nossa base, pensava eu, de acordo com plano que junto com ela fizemos em Rio Branco, de duas equipes, uma acima da base e outra abaixo, pousadas de helicóptero a distancia não audível dos invasores da base, que viriam por terra, na esperança de prendê-los.

O plano não foi executado. Sobrevoaram a base antes disso, de helicóptero, espantaram os caras. Uma equipe pousou na Aldeia Simpatia e subiu o rio. Foi resgatada antes de chegar na base. Outra pousou na base.

Nossos mateiros seguiram um rastro e entregaram o Sr. Joaquim Fadista, português que anteriormente foi preso aqui mesmo e deportado para o Peru, apesar se ser procurado por tráfico internacional de drogas, inclusive no Brasil. Voltou e foi preso de novo.

Satisfeita, a Polícia Federal abandonou a base, como se a missão estivesse toda realizada. Uma pequena equipe, Sr. Carlos Travassos, coordenador da CGIIRC/FUNAI, Artur Meirelles coordenador da Frente, Francisco de Assis (Chicão, mateiro), Francisco Alves de Castro ( Marreta, mateiro) e  José Carlos Meirelles ( Governo do Estado do Acre), por decisão unânime, resolveram vir para a base, que era de novo abandonada.

A Polícia Federal lacrou a base. No outro dia que chegamos estava tudo arrombado de novo. Os peruanos continuavam aqui. Vimos vestígios de menos de 15 minutos.

Veio de Rio Branco o Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar do Acre. Foram feitas pequenas incursões. Encontramos acampamentos, mochila dos peruanos com pedaço de flecha dos isolados dentro. O Bope vai e vem a Força Nacional, sem ordem de se afastar a 500 metros da base.

Nestes dias de Força Nacional, sempre se escuta tiros em locais próximos à base, à noite, com características de arma de bala e não de cartucho.

Esta noite mesmo, foram ouvidos três disparos, de um lado e de outro do rio. A Força Nacional está esperando o Exército, que deveria aqui chegar no dia seguinte à invasão da Base, ocorrida há quase um mês.

E ninguém ainda se dispô a bater realmente estas matas e desvendar o que realmente estas pessoas, que continuam aqui, fazem e querem. Não temos acesso ao depoimento do português. Parece que é propriedade da Polícia Federal.

Há tempos, desde 2007, temos alertado sobre a exploração ilegal de madeira, do outro lado da fronteira, em reserva de isolados no Peru, a reserva Murunahua.

Agora, tudo leva crer que além de madeireiros, temos traficantes de drogas. E pelo andar da carruagem, como se diz aqui pelas matas, parece que estão botando roçados. Ou seja, não tem a mínima intenção de ir embora. Afinal, ninguém os perturba. Nós da Funai, do governo do Acre e os mateiros, que ganharam um presente da Funai: foram dispensados, mas estão aqui por opção. O risco é por nossa conta, somos pagos ou não pra isso.

Os índios isolados da região, verdadeiros donos desse pedaço de Amazônia, não tem nada com isso. E serão eles, com certeza, mais uma vez que pagarão o maior preço pela invasão de suas terras por um grupo  de traficantes e sabe-se lá mais que personagens.

Não dá mais pra esperar calado. Não vou mandar abraço pra ninguém. Meu coração está apertado. Quando sinto essa sensação, dificilmente erro.

José Carlos dos Reis Meirelles é sertanista

fonte:Blog do Altino:http://altino.blogspot.com/2011/08/nao-da-mais-pra-esperar-calado.html

ACREditar! - Isolados precisam de Proteção

Video mostra imagens dos Isolados no Acre.